As multas por uso de celular ao dirigir cresceram de forma significativa no Brasil. Dados do Ministério dos Transportes apontam que, até novembro de 2024, houve aumento de 16,3% nas autuações por “segurar” o aparelho e de 13,2% por “manusear” o dispositivo em comparação ao mesmo período de 2023. Além dos números, estudos de segurança viária revelam que a prática de digitar mensagens ao volante pode aumentar em até 400% o risco de acidentes, colocando condutor, passageiros e pedestres em grave perigo.
Para o advogado especialista em trânsito, Walber Pydd, os dados confirmam que o celular está ocupando hoje o mesmo espaço que a embriaguez ocupava há alguns anos. “A chamada ‘nova infração do bafômetro’ não é apenas um problema estatístico, mas uma ameaça concreta à vida. A distração causada pelo uso do aparelho é imediata e retira totalmente a atenção do condutor”, explica.
Dados da Prefeitura de Curitiba mostram que, no ano de 2024, foram cometidas 15.813 infações por dirigir veículo segurando o telefone celular. Já no ano de 2025, até o mês de junho, foram 6.408 infrações.
Segundo informações da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), o uso do celular ao volante ocupa a terceira posição entre as principais causas de mortes no trânsito no Brasil, ficando atrás apenas do excesso de velocidade e do consumo de álcool.
Estima-se que essa prática seja responsável por cerca de 150 mortes diárias nas rodovias brasileiras, resultando em cerca de 54 mil óbitos por ano. Esses dados alarmantes mostram a necessidade da conscientização dos condutores e uma grande mudança em suas atitudes.
Uma pesquisa feita pela instituição britânica RAC Foundation mostrou que enviar mensagens enquanto dirige reduz o tempo de reação do motorista em 35%. Isso porque em caso de emergência, o tempo disponível para enxergar, avaliar e tomar uma ação pode não ser suficiente para evitar um acidente. Além dos impactos no tempo de reação e na distração visual, o uso do celular pode levar à perda de controle do veículo. Quando o motorista se concentra na tela do aparelho, ele perde a percepção dos movimentos do carro, o que pode levar a desvios de faixa, frenagens bruscas e até colisões.
Pela legislação brasileira, a infração está prevista no artigo 252 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), em parágrafo incluído pela Lei 13.281/2016, indicando que segurar ou manusear o telefone celular ao dirigir é considerado falta gravíssima, punida com multa de R$ 293,47 e a perda de sete pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
De acordo com dados divulgados pelo Portal do Trânsito, mais de 240 condutores são multados por hora por usar o celular enquanto dirigem.
Essa tipificação legal é ampla, abrangendo desde a digitação de mensagens até o simples ato de conduzir o veículo com o telefone em uma das mãos. “Muitos motoristas acreditam que só serão multados se estiverem falando ou digitando no aparelho, mas o próprio gesto de segurar o celular já basta para caracterizar a infração. Isso ocorre porque dirigir exige atenção plena e ambas as mãos disponíveis para o controle do veículo”, afirma Pydd.
Além disso, usar o telefone celular enquanto dirige (falando, inclusive com fones de ouvido) caracteriza-se como infração média, com penalidade de quatro pontos na CNH e multa de R$ 130,16;
E mais: muitos motoristas acham que podem mexer no celular enquanto estão parados no congestionamento, ou esperando o sinal abrir, mas além de prejudicar a atenção do motorista, também caracteriza infração de trânsito.
Pontuação
O impacto na pontuação do condutor também é relevante. Desde a entrada em vigor da Lei 14.071/2020, que alterou as regras de suspensão, a contagem de pontos varia de acordo com a gravidade das infrações cometidas. O motorista pode ter a CNH suspensa com 20 pontos, caso tenha duas ou mais autuações gravíssimas; com 30 pontos, se tiver apenas uma; ou com 40 pontos, se não houver nenhuma gravíssima. “Esse efeito cascata é especialmente danoso para motoristas profissionais. Uma única multa por celular pode comprometer todo o histórico do condutor e abrir caminho para um processo de suspensão, com consequências diretas no trabalho, no sustento e na credibilidade do motorista. É por isso que a legislação tratou essa conduta como gravíssima”, reforça o advogado.
Pydd explica que a fiscalização acompanha esse cenário e tem se tornado cada vez mais rigorosa e tecnológica, sendo que em diversas capitais e rodovias federais, agentes já utilizam videomonitoramento, câmeras de alta resolução e até inteligência artificial para flagrar motoristas que utilizam o celular enquanto dirigem. Em operações da Polícia Rodoviária Federal, por exemplo, foi registrado aumento de mais de 500% em autuações após a adoção de sistemas de monitoramento inteligente. “O cerco está se fechando. Hoje não é mais necessário o contato físico do agente com o condutor para constatar a infração. As imagens gravadas servem como prova, e a tecnologia amplia a capacidade de fiscalização, tornando praticamente impossível esconder o uso do celular ao volante”, ressalta.
Exemplos de outros países
A preocupação com esse tipo de comportamento não é exclusiva do Brasil. Em países vizinhos, as autoridades de trânsito também estão endurecendo as regras. Na cidade de Buenos Aires, por exemplo, ser flagrado mexendo no celular pode gerar multa superior a 120 mil pesos argentinos, valor que convertido chega a cerca de R$ 2 mil. As penalidades variam conforme a conduta, mas a mensagem é a mesma: tolerância zero com a distração ao volante. “A comparação internacional é importante porque mostra uma tendência global. Não se trata apenas de punir, mas de sinalizar que a sociedade não aceita mais esse tipo de prática. A fiscalização em Buenos Aires é tão rigorosa quanto aqui e demonstra que estamos alinhados a um movimento regional de preservação da vida”.
Pydd finaliza reforçando que na rotina dos motoristas, as recomendações são claras: o celular deve permanecer fora de uso durante a condução. Recursos como o modo “não perturbe ao dirigir”, já presente em muitos aparelhos, ajudam a reduzir a tentação de responder mensagens. Para chamadas urgentes, o uso do viva-voz deve ser feito com cautela, sempre garantindo que não comprometa a atenção. Em qualquer outra situação, para digitar, ler mensagens ou usar aplicativos, a orientação é parar o veículo em local seguro. “Não existe justificativa aceitável para usar o celular dirigindo. A pressa de responder uma mensagem nunca será maior que a responsabilidade de preservar vidas. Cada segundo de distração ao volante pode ser decisivo. É preciso mudar a cultura de tolerância com essa prática”, finaliza.